domingo, 15 de agosto de 2021

E sopra o vento lúdico da eterna mudança...

Quando pequena (por volta dos 3, 4 anos), passei um tempo numa estância no sul do país, cercada pelo verde dos pampas, pela maciez da lã dos carneiros, pela impetuosidade dos cavalos e por tudo aquilo que a natureza traz em sua composição de mundo a refletir a edificação harmoniosa de Deus.

Mais tarde, senti bem a boa influência desse período, pois, sempre busquei agir conforme minha personalidade bucólica, onde o menos sempre foi mais.

Comida saudável, roupas confortáveis e naturais, viver com simplicidade: essa foi a dinâmica que trazia para minha vida um colorido nostálgico que me impeliu a retornar à vida no campo.

Quando me mudei da casa da minha mãe - por volta dos 29 anos - segui, de imediato, para um apartamento, sentindo grande diferença. Isso porque, até então, havia morado em casas, vendo minha mãe cultivando a terra, plantando as hortaliças, criando galinhas e convivendo com cachorros.

Decidi, desde então, que iria fazer um movimento gradual de retorno à vida simples do campo. Mais, que efetivamente iria retornar ao campo, à vida rural, longe do frenesi da urbanidade. Do apartamento, fui para uma casinha charmosa dentro da cidade mesmo, reproduzindo contudo, um modo de vida campestre. 

Plantei uma amoreira, iniciei meu jardim de ervas e fiquei ali, contemplando o início dessa jornada. Aprendi muito com as amizades que me trouxeram essa visão, aliada à alimentação saudável e frugal. 

Grana curta para os padrões sociais de uma ilha de fantasia, mas abundante para os propósitos que estava ressignificando para minha vida.

Saía para estudar (fazia doutorado em direito na época), indo de bicicleta da Candangolândia até a Universidade de Brasília, observando, contemplando, contentando-me com a vida, simples, como ela é. 

Dinheiro rendia, mesmo contando as moedinhas do porquinho para comprar a ração do dia para os catiorros e gatíneos, meus companheiros de vida simples.

A brisa no rosto me indicava sempre o caminho literalmente certo, pois a paz era uma constância dentro de mim, mesmo diante, claro, dos desafios que diariamente se colocam à nossa frente. 

PLENITUDE, a palavra-chave. 

Mais tarde encontrei um chalezinho no jardim Botânico. Terreno maior, mais árvores frutíferas, córrego passando lá no final do condomínio. 

Imergi mais no processo, porque o local era propício ao silêncio e à simplificação. 

De lá dei um salto para um condomínio ainda mais distante, com outro chalé avizinhado pela mata e por macaquinhos. Clima ameno, estrada verdejante, um sonho, literalmente. Como a distância havia aumentado, passei a racionalizar demandas. Sair de lá? Apenas diante de uma extensa lista de itens.

Cachoeira no local, trilha meditativa, yoga na comunidade: tudo estava de acordo com o ritmo da simplificação e do despojamento. Assim como a pele da cebola, fui me descascando, aos poucos, para a próxima etapa. 

Na última casa de condomínio, horta mais ampla, mais plantio de frutíferas, fogueira, cerradinho. Vista do horizonte verde do vale. O mesmo córrego, agora, de uma perspectiva um pouco diferente, lembrando-me que o rio e o ser humano não são os mesmos de qualquer forma. 

No início do ano, o vento da mudança. Encontrei uma chácara, longe da urbanidade, com 3 km de estada de chão, mais 8 km até a cidadela mais próxima. Local promissor para tudo que sempre desejei desenvolver, agora em escala maior: compostagem, galinhas, hortaliças, água. 

Sobretudo, o silêncio. O silêncio que nos coloca a refletir sobre o propósito de nossas vidas, sem o ruído que o ego distraído busca imprimir para não se sentir sozinho. 

Cada dia apresenta seu peculiar modo de vida. Agora, literalmente não tenho à disposição a possibilidade de pegar o jipe e ir ali, em 3 minutos, comprar um fósforo para acender a chama do fogão. Descobri que preciso me virar um pouco mais com o que tenho aqui em casa. 

A despensa me mostrou o que nutria, ainda, de medo, da escassez. Encontrei comida estocada que sequer sabia que existia. Ela se transforma, todos os dias, em surpresas criativas, nos pratos que invento, na alimentação que busco balancear. 

Depois que contraí covid (em fevereiro), voltei a comer carne e tomar leite depois de 20 anos.

Foi um momento interessante, um mix de terapia com desespero, pois havia ficado 3 meses sem olfato e paladar. Agora, naturalmente, volto - sem drama, sem querer dar lição de moral, ética, especismo etc. - a retirar a carne, sem me ocupar se isso é "para sempre", quando eu mesma não sou.

"Sou vegetariana"? 

"Sou ovo-lacto-alguma coisa"?

Não sei, o rótulo oprime demais, traz para a gente uma tábua de lei que, sem fé, nada quer dizer. Ainda mais com o verbo ser, outro problema existencial, posto que confundido, sempre, com a ideia de perpetuidade, num mundo em que tudo se transforma. 

Estou fazendo amizade com os pássaros que ficam por aqui, cada qual com um som diferente, que nunca ouvi antes. Um deles, um amarelinho, vem todos os dias até a janela do banheiro, olha para dentro e vai embora. Livre e solto. 

O sono voltou a ser leve, o tempo, a esticar e parar. Estou aprendendo, ainda, falta muito que assimilar. Estou na lição do despojamento das planilhas do "a fazer", porque existe muito a ser feito, e não tenho mesmo o controle de variáveis.

O salário precisa render mais para que a chácara se pague na restauração feita para que pudesse me mudar. A seca castiga o cerrado, com o fogo dando seu alô de vez em quando. A chuva, em outubro, marca a necessidade de resolver o galinheiro e a horta o quanto antes. 

Mas o "antes", agora sei, é de acordo com o fluxo, e não segundo minha vontade. 

Deixei a aula presencial, grata pelo tempo em que passei indo ao Condomínio Verde compartilhar o yoga. A turma, contudo, segue. Seguimos o fluxo que o coronavírus nos deixou de lição para o yoga on line, direto da "fazendinha". 

Enquanto a chama persiste, eis-me aqui para continuar. 

Estou conhecendo pessoas novas, com novas experiências a compartilhar. Gente simples, num mundo simples, que me faz perceber o quanto existe ainda de possibilidade a ser agregada, basta a disposição interna. 

O mundo, aos poucos, vai se redefinindo, moldando, modelando ao estado de alma, mostrando que, ao final, é o que trazemos dentro de nós que marca as escolhas a serem feitas...

São os ventos de mais uma mudança...

Gratidão, gratidão e gratidão.
 

terça-feira, 10 de agosto de 2021

Quando a mudança vem e o propósito vai: lives for a new life, reflexões sobre a experiência da plenitude


Mudanças sempre nos trazem o convite para sair da zona de conforto e de uma espécie de "ostracismo" existencial, catapultando-nos a novas experiências, ressignificações, bem como a novos valores e atitudes.

Estava lendo aqui minha última postagem, láááááá em dezembro. Muita água rodou moinhos: contraí covid-19, fiquei meio sequelada, renovei algumas convicções, implodi outras tantas. 

Concretizei um projeto antigo de ir para uma chácara e incrementar, ainda mais, a visão living off the grid de mundo. Ovos, horta, pássaros, silêncio, liberdade, plenitude para os catiorros, gatíneos e, claro, para minha jornada. 

Desafios que se descortinam todos os dias: como lidar com o lixo produzido em casa, como lidar com a distância até o trabalho, estrada de chão, acesso a bens de consumo, enfim, elementos que, outrora, estavam na pauta de um dia-a-dia que, a cada dia, tenho descoberto ser apenas uma perspectiva.

Daí a ideia de compartilhar essa fase da vida, pois sempre escuto atentamente pessoas queridas desejando "dar um novo rumo na vida", "desacelerar", "mudar de vida". 

Como, então, fazer isso? 

Não sei, não tenho fórmulas prontas, muito menos que sejam universalizáveis, pois cada um tem a singularidade de jornada, que traz opções e escolhas distintas, ainda que, em regra, os dilemas humanos possam ser os mesmos, em menor ou maior grau de sofisticação. 

Esse vídeo acima inaugura essa fase fecunda: chama-se Lives for a new Life, iniciando com uma reflexão que tomo como premissa para o restante da conversa: qual é o seu propósito?

O quanto estamos dispostos a lidar com apegos e desapegos, para que possamos alimentar mais o espírito e esvaziar, assim, um pouco, o saco sem fundo do ego que vive para desejar, expectar e se frustrar. 

Fica o convite à reflexão...