domingo, 26 de abril de 2020

Quando mudar o mundo é se transformar...


Sempre estamos às voltas com notícias das mais variadas, mas um ponto, porém, traz um pano de fundo comum: a existência de uma demanda ou um desejo que, por trás de cada notícia veiculada, desperta nossa empatia, fúria ou apreço.

Ora demandamos civicamente posturas de políticos e agentes públicos, ora estamos a protestar diante de uma notícia de cunho político.

Sobretudo protestar, falar, colocar para fora nossa contestação, indignação, nossa opinião!!! 

O protesto tornou-se uma das grandes marcas da contemporaneidade virtual, que reúne nos abaixo-assinados e nas redes sociais nossa forma distanciada de lidar com aquilo que expomos em termos de expectativas, sejam sociais, coletivas ou até mesmo individuais.

Sentimo-nos parte de algo pulsátil quando agregamos esses movimentos, numa espécie de solidariedade anônima, mas que traz uma mágica vinculação nos destinos de nossa sociedade ou comunidade. 

A partir do sucesso de tais pequenas-grandes conquistas, passamos a desejar mais... Pensamos "grande", expandindo as fronteiras do que podemos pensar em modificar. 

Desejamos ardentemente que o mundo "mude", que "as pessoas se transformem" para dar lugar a "um mundo melhor", com harmonia, paz social e harmonização com a Natureza. 

Em idos de pandemia, indignamo-nos diante de quem não usa máscara, não faz isolamento social, ou, ainda, de quem faz carreata e demanda a abertura das porteiras econômicas.  

Bradamos por mudanças na política, na sociedade, na vizinhança, no condomínio etc..

Ansiamos, sempre mais e mais, por um futuro sustentável, com comida organicamente saudável, damos curtidinhas nas fotos campestres e reciclamos nossas roupas, aderindo a um "projeto de mundo novo". 

Mas, enfim, quando nos deparamos com uma notícia não lá muito agradável a esse "Projeto Nova Gaia", parece que vem uma bomba atômica lá de dentro do estômago revolto, fazendo com que nossos dedinhos digitem rapidamente - tec, tec, tec - palavras de ordem, textos inspirados e concitadores da revolução invisível que pretendemos, todos os dias, realizar. 

Falo isso muito em função da identificação em face dessa "saudável" rebeldia: uma eterna rebelde "cara-pintada", idealista desse projeto todo de melhoria de vida no Planeta Terra. Quando percebia, já estava a vociferar textos e mais textos, citando vários autores, para pretender, com isso, modificar substancialmente a maneira de pensar do outro. 

A docência foi bem esse caminho de modificação de pequenos mundos, 20 anos de longas aventuras e histórias, nunca desistindo do projeto transformador para que nosso ambiente e casa, em nível global, desse aquele salto quântico rumo à ruptura com os chamados antigos paradigmas. 

Ultimamente, colocando-me a observar e, sobretudo, a me observar, observar esse ser que está agindo nesse corpo, tenho mudado minha percepção. Não racionalmente, por convicção de ser melhor ou mais valoroso, mas porque, no dia-a-dia dessa vida toda que está aí, o processo emerge e, dentro dele, quando vejo, já estou sentindo, de outra forma, necessidades distintas das que embalavam meus "grandes projetos". 

Esses dias de recolhimento têm sido um providenciais, pois, no início, pegava-se mentalmente especulando em que esse processo todo iria desembocar ou, dito de outra forma, "como o mundo seria depois da pandemia". 

Fui de teoria conspiracionista até estudos de ocupação de outros planetas, vida sustentável no deserto. Tudo que acenava uma resposta para os "novos contornos da Terra" fui agregando, puxando, lendo, deglutindo e empurrando aqui para a mente, já esgarçada por tanto fluxo e especulação. 

Quando dei por mim, percebi que a frase que mais estava usando era "as pessoas são" ou "as pessoas deveriam", numa formulação mágica a trazer a solução para todos os desafios da humanidade. O empírico, contudo, atravanca, pois "as pessoas" não fazem e nem sequer devem fazer coisa alguma do que eu especulo...

Daí, meu mundo caiu... 

Antes de perguntar "se o mundo irá mudar após tudo isso", se "as pessoas serão assim, assim ou assado", comecei a olhar para meu quartinho de despejo emocional, sentindo a necessidade de pensar em como eu posso mudar diante da vida?

Estou está satisfeita com sua vida? 

Não, não me refiro ao conformismo, mas a realmente comecei a me perguntar se estou vivendo de uma maneira que me traz contentamento como estado de plenitude...

Não estou? Então, o que me impede de mudar? Passei a sentir mais isso, essa necessidade de escutar a voz do coração. 

Dinheiro? Trabalho? Pessoas? Viagens? Relacionamentos?

Tudo isso são externalidades, nada disso está em mim e no potencial transformador.

Daí comecei a perceber um fluxo bem positivamente disruptivo, em como posso e já estou transformando minha vida, a partir da superação do comodismo, do conformismo, da preguiça, da zona de conforto e do medo para fazer aquilo que o coração manda...

O mundo passou, então, a estar diferente só porque decidi mudar meu pequeno mundo! Esse, acho, é o grande convite para todos, sem cobrança, expectativa: que cada qual seja a mudança que pretende ver no mundo (M. Gandhi)!!!

Hidratação, desobstrução e purificação com o jala neti

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🕉Com o outono trazendo a seca, importante cuidar do sistema respiratório e as narinas são a porta de entrada dele. A prática constante de jala neti (kriya de limpeza nasal) hidrata, desbloqueia e purifica.

🕉Ferva água filtrada (500 ml) e espere ficar com a temperatura morna para fria.

🕉Adicione meia colher rasa de sal e, para hidratar, 2 gotas de óleo de gergelim.

🕉Coloque no recipiente, encoste o bico na entrada da narina de um dos lados, penda a cabeça para o lado e forme um fluxo de água. Ela entra pela narina que está acima e sai pela de baixo.

em caso de sinusite, acrescente 2 gotas de própolis
em caso de rinite, use 2 gotas de limão

ao terminar, pode pingar 1 gota de óleo de gergelim em cada uma das narinas, pois ele tem vitamina E, responsável pela hidratação.

quarta-feira, 22 de abril de 2020

A completude do caminho do yoga

Estamos vivenciando um momento ímpar na história da civilização, principalmente por conta diversidade de conhecimento, culturas e valores compartilhada pelo acesso mais facilitado que o mundo virtual trouxe em relação às tradições e ensinamentos de outros povos.
Nesse contexto, muitos conhecimentos e práticas ancestrais e orientais, como as medicinas ayurvédica e chinesa, o tai chi chuan, a meditação e, sobretudo, o yoga, têm se popularizado no Ocidente e, especificamente, aqui no Brasil, nos últimos 10, 15 anos. 
Basta acessar uma rede social(instagramfacebooktwitter), para perceber uma vasta agenda de aulas on line, cursos ou formação via ensino à distância, lives, hangouts, postagens, sem falar na famosa selfie tirada ao se reproduzirem posturas (particularmente não as encaro como asanas, mas isso é assunto para outra postagem), redimensionando novas situações a conviver com a tradicional prática presencial no shala[1]
Esse cenário, contudo, quando não contextualiza minimamente o yoga em relação à sua essência, história e seu posicionamento enquanto darshana[2], pode difundir a falsa e estereotipada percepção de que yoga se limita à realização de posturas ritmadas de acordo com a respiração e sob os auspícios do mantra OM.
Empiricamente falando, o yoga revela uma senda de autoconhecimento, com forte conteúdo de compreensão de nossa essência para além dessa dimensão material, constituindo também a busca de superação da inquietude mental para se chegar a um estado contemplativo de transcendência. 
Não se confunde, portanto, apenas com o momento da prática no tapetinho, mas, antes, extrapola e, para além dele, ressignifica a senda do praticante que está disposto a imergir nesse universo rico e a reconfigurar a maneira com a qual, até então, sentia, percebia e vivenciava sua estadia no Planeta Terra. 
Para tanto, prática, estudo, meditação e, sobretudo, disciplina, desapego e resiliência, são elementos essenciais na integração dessa senda, que ora projeta um forte componente devocional, verdadeiro compromisso bhakta[3] em relação a alguma deidade ou à transcendência impessoal, ou, ainda, ao aspecto meramente de estudo e compreensão, presente no jnana-yoga[4]
Historicamente falando, o yoga traz um forte componente sócio-político, a partir da ideia de contestação à casta bramânica responsável por monopolizar os ritos e o conhecimento para o grupo social do sacerdote. 

Trata-se de um fluxo que toma corpo desde 1.600-1.220 anos antes de Cristo, com algumas pinceladas imersas nas Upanishads, passando pela compilação mais famosa, os Yoga Sutras de Patanjali (200 a.C-400 a.C.)
Com a gradativa consolidação do yoga como um sistema (darshana), não seria necessária a figura intermediária do sacerdote a oficiar sacrifícios de obtenção do soma[5], para se atingir a verdade em Brahma, num verdadeiro deslocamento da religiosidade formal e tradicional coletivo para a mística individual, retirando, aí, a força do acesso à divindade por meio de sacerdotes e centrando no caminho pessoal essa busca. 
No fragmento da Mundaka na versão de Swami Prabhavananda dos Upanishad[6] é possível perceber essa reflexão sobre o  acesso direto, a partir da austeridade, do autocontrole e da meditação em silêncio (1975, p. 60), razão pela qual faz muito sentido essa transição do estado ritualista para um no qual o rito é abolido para dar espaço a um modo místico e filosófico de agir, pensar, meditar etc. em encontro ao Eu Superior sem intermediação sacerdotal.
Nesse sentido, a própria ideia de senda individual, por meio da prática de um sadhana[7], por exemplo, dá a tônica da transição do rito para o caminho solitário que vai se elaborando ao longo do percurso, por intermédio da vivência dos angas[8] (membros), revelando para o praticante seu Eu Superior, por meio do discernimento e da elevação.
Esse, em especial, é o ponto central que dissocia o yoga de uma prática lúdica, de natureza psicofísica: yama, niyama, asana, pranayama, pratyahara, dharana, dhyana e samadhi, os 8 angani do Yoga, retratados classicamente nos Yoga Sutras de Patanjali, especificamente no capítulo 2-29, chamado Sadhana. 
Panoramicamente falando (pois falaremos em cada um), yamas são preceitos éticos e, portanto, de observância interna e pessoal pelo praticante, no dia-a-dia de sua conduta: ahiṁsā, satya, asteya, brahmacharya e aparigraha
Em linhas gerais, ahiṁsā é a prática de não violência, um preceito genérico, que não apenas se relaciona ao aspecto qualitativamente físico, mas a absolutamente tudo que diz respeito à agressividade, refletindo, em nossa jornada no dia-a-dia, a modulação de nossas conduta, para que, não nos violentemos ou projetemos nos demais seres essa violência, em nível algum.
Satya é a verdade maior, que deriva do coração desapegado, ou seja, à coerência entre o pensar, falar, agir e viver. Daí surgem esses reflexos e, dentro deles, as irradiações. Um sentimento escondido, não comunicado sob a máscara de "está tudo ótimo", uma "volta" ou "ardil" que damos em nós mesmos e projetamos no outro, impedindo-o de escolher livremente.
Asteya se relaciona com a abstenção em não se apropriar do que não lhe pertence que diz respeito à honestidade em pensamento, palavra, ação, modo de vida. Não se trata apenas de não furtar objeto, mas de toda prática que diz respeito a produzir desequilíbrio em relação ao outro nesse fluxo de ir e vir de abundância, em todos os sentidos.
Brahmacharya relaciona-se à prática de uma vida espiritual regrada (BARBOSA, 2015, p. 89), marcada pela austeridade na ação dentro da conduta, muitas vezes confundida com o mero celibato, mas com sentido bem mais amplo do que isso. 
Aparigraha encaminha para o não cobiçar, contentando-se com sua realidade despegada. 
Já os nyamas estão relacionados às práticas a serem observadas pelo yogui ou pela yogini, sendo, portanto, a manifestação externa de suas ações: sauca, santosah ou santosha, tapas, svadhyaya, isvarapranidhana.  
Sauca constitui a limpeza, tanto externa, como interna, mental, a exemplo do que fazemos com os kriyas. Santosah ou santosha revela o contentamento interno, um olhar de plenificação, de bastar a si com o que se tem ou se alcança. 
Tapas representa sacrifício ou, como fala Feuerstein, a capacidade de suportar extremos (2005, p. 236) mantendo o brilho interno. 
Svadhyaya relaciona-se ao estudo e meditação, almejando o saber interior.
Ishvarapranidhana constitui a entrega, oferecendo a prática ao mestre supremo e que, individualizado, reside no coração do yogui ou da yoguini
Asana é o "assento firme e confortável" (Patanjali), enquanto o pranayama constitui o fluxo de inspiração e expiração, bem como retenção (kumbhaka) do prana, por intermédio da consciência do que isso significa em termos de sutilidade.  
Pratyahara se manifesta no recolhimento dos sentidos (audição, olfato, tato, visão, paladar), evitando, assim, a conexão, por intermédio da identidade com o objeto externo disposto no chamado mundo visível ou perceptível (que é uma imitação ou representação). 
Dharana constitui a "fixação da mente (citta) em uma território" (BARBOSA, 2015, p. 101), enquanto dhyana é o foco ou a fixação da atenção em um único objeto, com convicção, atingindo-se, então, o samadhi, por meio do esvaziamento da "forma autêntica e semelhante à natureza do objeto" (BARBOSA, p. 101).
Assim, não constitui o yoga uma mera prática física e lúdica, mas, antes, um modo de vida, desde o aspecto espiritual, passando pelo ético, emocional, psicológico, mental e físico, razão pela qual não pode ser retratado superficialmente como uma sequência de poses, muito menos pelo aspecto meramente meditativo, pois essa polarização acaba desfocando da beleza e da profundidade desse sistema filosófico.
Dentro disso, o yoga é uma senda, um percurso, um caminho, e não um instrumental a ser acionado momentaneamente, por ocasião das aulas ou do convívio familiar, para se pretender mudar de vida e "sair da Matrix" (esse é o senso comum que tem se estabelecido).
É uma dedicação, dia após dia, por intermédio do enfrentamento as ciladas da mente arredia e indisciplinada, que nos faz cair no auto engano. 
O aporte imagético e o discurso subjacente a ele são também ciladas egoicas que, nesse sentido, atribui as chamadas fraquezas ao yoga moderno, que acaba reproduzindo o dilema estereotipado.
Isso requer uma profunda auto-observação em relação aos movimentos internos de fomento à concorrência, crítica velada, isso e tudo mais, dão a tônica do que o yoga moderno precisa depurar. 
Acredito que o caminho para isso seja desenvolver uma estratégia de abordagem orgânica, sensível, mas, ao mesmo tempo consistente, que se escoime nos textos, na leitura das peças mais relevantes e, sobretudo, na introdução de seus sentidos na prática diária do yogui
Nesse sentido, os cursos de formação têm um papel importantíssimo, quando comprometidos com essa verdade, pois permitem uma imersão profunda nesse universo desconhecido, alavancando o mergulho no próprio universo desconhecido do praticante, revelando seu dharma[9]
Por isso acredito que formação vertical ainda seja muito importante. Aprender asana e realizá-lo é importante, mas não representa a totalidade da experiência edificante que o yoga pode oferecer em termos de autonomia existencial. 
Para os professores-facilitadores-instrutores, creio que deva ser interessante introduzir, nas práticas, temas e elementos filosóficos, compartilhando, assim, informações congruentes sobre o yoga
Para os praticantes, creio que a disciplina e o foco na necessidade de estudar os textos seja prioritário (jnana yoga), devotando-se ao sagrado (bhakti yoga), realizando ações (karma yoga), imergindo na meditação profunda (raja yoga) e também no incremento postural (hatha yoga), advindo, daí, o ajustamento do Eu ao Si-próprio, ou, como presente na etimologia da palavra yuj, jungir, integrar ou unir!
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[1] Shala significa "casa".
[2] Darsana traz a ideia de visão ou vista.
[3] Bhakta significa devoto, do bhakti, devoção, que origina o bhakti yoga, yoga da devoção.
[4] Jnana yoga, traduzido como yoga do conhecimento, estudo.
[5] Soma, traduzido como extrato, libação usada nos rituais antigos védicos.
[6] Upanishads são textos antigos védicos, transmitidos oralmente. 
[7] Sadhana significa um caminho ou meio, senda. 
[8] Angas, traduzindo para membros, ou elementos componentes do yoga.
[9] Dharma, aqui empregado no sentido de vocação, dentro do caminho de austeridade e retidão na descoberta do Eu-em Si.