domingo, 26 de janeiro de 2020

Yoga, uma jornada de autotransformação...

A imagem pode conter: Alessandra de La Vega
A trajetória existencial humana é marcadamente caracterizada por inúmeras situações que acabam se transformando em verdadeiros marcos em nossa existência, seja porque imprimem sensações que se prolongam e trazem alegria, leveza, plenitude, saudade ou dor, seja porque, a partir delas, contundentemente a vida não pode ser mais a mesma. 

Trata-se de um divisor de águas na jornada, uma espécie de raio incidental que, cortando o curso causal da existência, imprime novos caminhos. 

Ou, usando uma metáfora mais imaginável sensorialmente, uma enxurrada que modifica o curso do rio, de tal forma que, depois da chuva, a geografia não pode mais ser a mesma, como no imaginário de Heráclito de Éfeso, para quem subsiste a impossibilidade do rio e do ser humano não serem mais os mesmos diante da efemeridade...

A primeira pedalada sem rodinhas, o primeiro tombo, o primeiro beijo, primeiro dia de aula: inícios, de maneira geral, trazem aquela sensação mista de borboletas na barriga, um friozinho gostoso diante do desconhecido que se apresenta, como uma esfinge, para que o desvendemos. 

A primeira vez em que participei de uma prática de yoga, lá pelo ano de 2005, foi exatamente assim, uma enxurrada que reconfigurou minha existência... 

Isso porque, desde criança, sempre tive curiosidade inata em relação às questões do céu, da terra, da água e do ar (como diz a música), elaborando um mundo lúdico de fadas, gnomos, bruxas e magia que, depois, com a idade, foi compartilhando espaço com outras buscas espirituais. 

O percurso, contudo, configurava-se a partir de uma evasão de mim para o "alcance das estrelas", num processo racional de conhecimento distanciado da alteridade divina e do ambiente, sem que nele necessariamente eu estivesse presente como elemento de potencial e latente transformação. 

Essa apartação acabava por desconsiderar um percurso de internalização e solitude necessários para a penetração, a fundo, nas questões mais viscerais, ora registradas nas camadas mais densas da psique, alma, espírito e, sobretudo, consciência, ora nas mais sutis e impenetráveis pela racionalidade ordinária. 

Cultos, rituais, transcendência para encontrar a luz, a salvação, Deus. 

Independentemente de credo, religião ou prática espiritual, os caminhos duais de transcendência marcam numa espécie de catapulta espiritual, para que, por meio de orações, mágicas, sigilos, ingredientes etc., saiamos da experiência carnal entendida como ordinária, profana e comum (até mesmo pecaminosa), para a sublimação em um mundo de amor, compaixão, discernimento e poder. 

Familiarizada com as catarses, recusava o yoga e a meditação...

Meu melhor amigo presenteava-me com livros e mais livros nesse tema, mas, àquela época, não lia coisa alguma, porque a quietude que apresentava a partir deles era incompatível com o fulgor do pulsar dos "meus" átomos arredios. 

Praticante ávida de natação (5.000, 6.000 metros por dia), acreditava piamente que yoga "não era para mim", pois era muito "devagar, quase parando", não produzia tônus (rsrsrs). Meditação, então, impossível, pois "não conseguia" (essa era a programação mental), achava que não "era para pessoas ansiosas". 

Foi quando, em 2005, bem estressada com a vida profissional e acadêmica, conheci a prática de yoga com a yogini Kátea Barros no Centro Olímpico da Universidade de Brasília, para onde fui por muita, mas muita insistência de um colega de profissão. 

Uma fenda disruptiva, então, deu início à mais acalentadora sensação de plenitude e leveza que poderia experimentar. 

Primeiro, porque desfiz o mito de morosidade que cerca o imaginário de quem não conhece o mundo do yoga. Permanecer nos ásanas, harmonizando aspectos tão caoticamente dispostos em minha fisiologia foi o primeiro desafio, já na primeira prática, pois sequer permanecer nas posturas consegui. 

Respiração ofegante e torácica de um lado, membros trepidando de outro... 

Mente perdida nos prazos processuais, espírito-não-sei-onde-estava... 

Essa fragmentação foi, de fato, o primeiro impacto que recebi de percepção dissintônica em relação aos meus corpos. 

Diante desse horizonte dantesco do "primeiro dia", a prática de yoga foi consolidando um caminho de disciplina, constância e perseverança, resultando transformações substanciais em minha vida.

Começou inicialmente por imprimir mais resiliência, foco e determinação nos propósitos e ações, sobretudo diante de tantas atividades que costumava começar e não continuar na infância, adolescência e fase adulta (lutas, ballet, natação, basquete etc.). 

Nesse sentido, o yoga facilitou a estabilização emocional, aplacando a ansiedade que me fazia desistir das atividades de que tanto gostava, apaziguando meu espírito e edificando a plenitude necessária para o mergulho no autoconhecimento. 

Desde 2005, lá se vão anos sem que eu tenha parado ou abandonado a prática. 

Isso não me faz, por óbvio, uma yogini profissional, imageticamente posicionada nas redes sociais com séquitos de "seguidores", tirando selfies e mostrando malabarismos do Cirque de Soleil

Aliás, a cada dia tenho sentido, mais e mais que, numa foto, para a qual nos "preparamos" e "preocupamos", muito pouco existe de yoga e muito há de mera performance (pois yoga é senda, impassível de ser abduzida, captada, coaptada e limitada no achatamento fotográfico instantâneo e que, consciente ou inconscientemente, pode servir para aporte egoico de superação). 

Aliás, levei bastante tempo para superar o medo e subir no shirshasana

Longe disso, ainda manifesto limitações e contingências, mas, por outro lado, trata-se de clarificar processos, imergir na jornada e, descobrindo mais sobre mim mesma, seguir adiante e organicamente me soltar, entrar nas posturas...

Com isso, antes mesmo de pretender elaborar posturas difíceis, a mágica do yoga foi agindo, camada a camada... 

Primeiro, facilitou a estabilização emocional, aplacando a ansiedade que me fazia desistir das atividades de que tanto gostava, apaziguando meu espírito e edificando a plenitude necessária para o mergulho no autoconhecimento. 

Ainda na externalidade, outro aspecto para o qual o yoga contribuiu bastante foi a redução de peso, pois, no ápice da ansiedade, experimentei uma compulsão alimentar que me fez alcançar 85 quilos, o que era totalmente antagônico à minha formação, pois vinha de um lar “alternativo” (mãe proprietária de uma loja de produtos naturais e tia bióloga, ufóloga, macrobiótica e, depois, vegetariana). 

Pouco a pouco, voltei a me nutrir melhor, retomando antigos hábitos saudáveis de alimentação e, com isso, voltando ao peso usual e saudável. 

Concentração, paciência, resiliência e, sobretudo, discernimento, esses foram e têm sido as grandes contribuições do yoga em minha vida desde então, culminando com o retorno para os estudos sobre espiritualidade e ciência. 

Venho de uma dupla formação, indo da Física (1989-1993) para o Direito (graduação em 1998, mestrado em 2003 e doutorado em 2014), ambas ciências ditas “tradicionais” e dogmáticas, em contraste com a fluidez e a suavidade do yoga enquanto filosofia, conhecimento e, sobretudo, prática.

Com isso, tenho transposto alguns desafios que julgava, até então, intransponíveis (enrijecimento da coluna, medo de realizar uma invertida, entre outros). 

Com o yoga vieram novas literaturas em áreas que guardavam alguma relação entre si (Física Quântica, hinduísmo, budismo, ayurveda, neurociência), que, por sua vez, encadearam novos mergulhos, principalmente no Sagrado Feminino e no Ecofeminismo. 
A imagem pode conter: uma ou mais pessoas, pessoas sentadas, mesa e sala de estar

Tudo se articulava harmonicamente nessa senda, acarretando, cada vez mais e mais, mais superações em minha vida. 

O yoga, assim, foi um grande apaziguador e curador de muitas feridas, incentivando-me a desejar contribuir para que outras pessoas, sobretudo mulheres, pudessem igualmente usufruir da magia curativa desse caminho de fé e esperança. 

Hoje, após o curso de formação, sigo na senda, compartilhando a prática com quem desejar mergulhar mais em si e, para além de si, no universo em contemplação. 

Durante 8 meses estive à frente do voluntariado em uma ONG daqui da região, o que, ao final, muito mais do que formação ou certificação, trouxe-me, como ser e andarilha, o estreitamento de laços, não apenas com as praticantes envolvidas no projeto social, mas com a comunidade local. 

Tenho aprendido muito sobre sustentabilidade e bem-estar com os comerciantes, artesãos e produtores locais, cultivando o hábito de ir até a Feira do Produtor, bem como a hortas locais para encontrar verduras, legumes, frutas e alimentos orgânicos mais acessíveis e cuja procedência acabo por conhecer mais e melhor. 

Essa jornada ainda está em pleno vapor. 

Não existe chegada, meta, objetivo, pois descobri que o passo-a-passo é, em si mesmo, a jornada inteira, processo transformador que não está acabado, uma vez que a continuidade da impermanência nos faz sempre seguir. 

Mas, diante desse elongamento que se desdobra em si, numa jornada de solitude (e não solidão), desejo, daqui para frente, consolidar minha prática, mergulhar mais profundamente nos estudos e praticar, no meu dia-a-dia, tudo aquilo que, no tapetinho, consigo realizar.  

A imagem pode conter: flor, planta, céu, atividades ao ar livre e natureza
Assim, leve, bem de leve!!!!

Namastê!!!!

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