quarta-feira, 22 de março de 2017

Fazendo as pazes com o próprio coração...

"O que nos cabe é decidir o que fazer com o tempo que nos é dado" - sempre que assistia à saga Senhor dos Anéis, lembrava-me dessa providencial frase do mago Gandalf, ao conversar com Frodo sobre o destino de Gollum. Por mais que achasse bela e enfática a sentença, muito ainda me distanciava e - em muitos muitos distancia - da internalização da importância disso para a tomada de importantes decisões em relação à vida e às escolhas. 

Hoje fui - como sempre faço - tomar um modesto banho na cachoeira, aproveitando para expurgar algumas energias que, até então, ingenuamente achava serem as únicas dentro de mim. Fiz meus ritos, pedi refúgio na mata densa e úmida, entrei e percorri o mesmo lindo caminho.

Escolhi um horário muito bom, podendo usufruir daquele santuário sem que ninguém estivesse presente. Conjurei a egrégora, arrepiando-me em cada momento de recitação emocionada do ritual. 

Lancei-me na cachoeira e ali, hoje, mais uma vez e de outra diferente vez, pude sentir a força da Natureza impregnando minha alma de plenitude para produzir rupturas em minha alma. 

Aos poucos me peguei me perdoando e perdoando tantas pessoas que, um dia, julguei terem aviltado minha alma. Uma espécie de mantra foi entoado, ao mesmo tempo em que imergia na água forte e fria, sentindo-a penetrar por cada ponto longínquo do meu corpo. 

Nesse processo, percebi que o melhor que podemos fazer por nosso coração é ficar em paz em relação ao que sentimos pelas outras pessoas: afinal, o sentimento é nosso. Podemos amar e continuar amando, independentemente de estarmos - ou não - com a pessoa. Que podemos respeitá-la, admirá-la, trazer um pouco dela para nosso coração, mesmo que o convívio tenha se rompido. 

Quanto mais a água limpava as arestas de minha vida, mas ampliava a lista de pessoas com as quais precisava me compor. Já estava nesse processo a algum tempo, procurando retomar contato com algumas pessoas que me eram caras e estimadas. Consegui, nesse sentido, conversar por alguns minutos ao telefone, enviar e-mail ou whatsapp. Mas a lista se ampliava...

Um estalo, enfim, pegou-me de sobressalto: a impermanência que passei a sentir dentro de mim. Mesmo falando nesse velho clichê de impermanência e da finitude, acomodamo-nos a entoar o mantra da efemeridade sem agregá-lo incondicionalmente às nossas vidas como constância. 

Ficamos nas conversas falando em aproveitar cada minuto da vida, enchemos a boca para falar em qualidade de vida, curtimos posts de alimentação saudável, mas somos incapazes de promover rupturas... 

Comemos papel crepon e isopor, trabalhamos 15 horas achando que isso mudará o mundo. Não muda... O que muda é nossa alteração interna, para que vejamos a vida e a possamos experienciar de outra maneira. De uma forma em que firamos menos o outro e a nós mesmos, de uma forma em que silenciemos o ego para ouvir mais. 

Em investir nos momentos como esses da cachoeira, de limpeza e conexão. Não temos o amanhã por certo, mas somos arrogantes o bastante para fazer planos certos, na tentativa, talvez, de driblar a única certeza que temos de algum amanhã.

Enquanto tudo segue o fluxo da tentativa humana de contar a inefável impermanência, sigo plena na percepção do que me é relevante no viver. Nada além de focar o instante efêmero, sem passado ou futuro para especular. Os momentos são o segredo. Perpetuá-los é tentar sufocar uma criança em descoberta de sua respiração. 

Plenitude, gratidão, ode à Grande Mãe Natureza, rainha do que é maravilhosamente mundano e imanente. a divindade está aqui, no Ar, na Água, no Fogo e na Terra, em cada voo solitário de um pássaro, em cada flor que desabrocha. 

No agradecimento. No estar, simplesmente estar.


domingo, 19 de março de 2017

O altar pleno da Natureza em expansão

Desde que me mudei para uma nova casa tenho experienciado os momentos mais mágicos e inexplicáveis de minha vida na Arte: uma espécie de abertura de portais, permitindo o acesso a uma série de aventuras e sincronicidades que me colocam em constante júbilo. 

Sonhos, premonições, desdobramentos, encontros providenciais com as mais distintas almas, tudo fluindo numa teia de surpresas (?) que trazem elevação e aquela sensação de paz constante, mesmo diante dos solavancos que vivenciamos durante a existência. 

Dentro do condomínio existe uma cachoeira de fluxo intenso e forte, um santuário de profunda conexão com os ritmos da Natureza. Ali os elementos se harmonizam em um bailado ímpar de beleza e devoção. 

Segue-se uma trilha que se inicia na estrada, com um portal de onde é possível saudar a Natureza e pedir refúgio para a entrada na mata. O microclima é sui generis ali, pois ainda que esteja calor, a umidade e o frescor já anunciam presença logo de início. 

O rio é a própria estrada, refrescando os pés de quem se permite retirar os calçados para sorver a benignidade que exala do contato entre terra e água: pequenas pedras massageiam as solas, enquanto o Sol refletido na água ilumina nossa trajetória até a cachoeira. 

Enquanto caminhamos, é possível esvaziar a mente e silenciar o espírito tagarela, aproveitando o embalo da respiração para oxigenar os órgãos internos e acalmar os pensamentos do dia-a-dia. Comecei um hábito que quase todos os dias chegar da rotina de trabalho, colocar o biquíni e partir para uma purificação na cachoeira. 

A água refrescante acaricia o corpo eventualmente enrijecido pelas tensões da vida. O fluxo cai em uma banheirinha bem generosa, onde é possível ficar horas e horas apenas aproveitando e sendo grata à benignidade de Anu, a grande Mãe. 

Muitos condôminos vão ali para meditação e socialização, em um espírito de comunidade muito bom. Levo meu japamala e fico ali, mantrando, meditando e silenciando, o que tem feito muito bem à alma. 

Os rituais ali são muito poderosos e belos! isso porque a cachoeira fica numa espécie de fenda, a permitir que Sol (Fogo) e Vento (Ar) venham comungar com a Terra e a Água, na diatônica da harmonização para a abertura do círculo. 

Em uma transmissão de legado tempos atrás, o clima estava tão maravilhoso com minha irmã-na-arte que a borboleta azul residente da cachoeira veio pousar em cima da minha cabeça, significativo sinal de receptividade. Prova disso foi o dia maravilhoso que passamos juntas, amarrando ervas de proteção e as consagrando para a Grande Deusa. Que dia mágico e feliz!

Na cachoeira é possível consagrar instrumentos, purificar jóias e cristais, além, claro, da profunda limpeza feita em cada ponto do corpo e das camadas anímicas componentes do ser. Uma verdadeira varredura de energia pode ser realizada por meio da conexão com a água. 

Quando não é a cachoeira é a chuva a cair no vale a nos brindar com o bálsamo do frescor. Um dia desses, ao som de Loreena Mckennitt, pedi à chuva que levasse embora os nodos ainda presentes na administração interna de minhas mazelas. 

Dançando e rodopiando com a água a percorrer meu corpo senti-me livre de tudo o que não me pertence, desalojando-me até mesmo de mim para ser a própria água quedando ao solo. Refeita, senti a força da criação presente em mim, empoderando-me para novos desafios que a senda mágica oferta para o aquilatamento da minha alma. 

Isso tudo sem deixar de mencionar as lindas araras, os tucanos e saguis que passeiam, para lá e para cá, alegrando a vida e tornando possível pensar que a vida está para além da mesmice de uma programação mental intensa, que nos assola e avilta se não tomarmos o cuidado de acalentar a alma com a reserva de amorosidade que somente a Mãe Natureza é capaz de nos oferecer graciosamente. 

Dias de plenitude! 

Sim, sei que sempre volto a falar neles, haha.

Mas, agora, estou sendo agraciada com o aconchego deles em minha escolha de morada. Aqui da janela posso apenas olhar para o horizonte e suspirar, esquecendo de tudo que não é vital, para simplesmente me entregar à maravilhosa experiência da liberdade.