sábado, 5 de março de 2011

Réquiem para um estelionato emocional...Parte 1

Começou assim, despretensiosamente, num olhar atento e furtivo, de canto de olho, que atravessou o ambiente e foi se instalar no olhar de um ser que se mostrou tão doce, sereno e gentil. Dizem por aí que, ao final, olhamos nosso reflexo projetado no outro, tendendo a achar que esse outro tão desconhecido será, ao final, parecido conosco, nas mínimas reações. Daí nos desarmamos, amamos, e achamos que tudo será lindo e lúdico, porque, compassivas, vemo-nos no outro de cima a baixo...

Convidada a me sentar com esse outro tão misteriosamente magnifíco, passamos um tempo agradável, o bastante para me lançar nas palavras sábias sobre ONG, vida, realizações. Ouvi parte de sua história de vida, seu curso concorrido na Universidade pública, seu cargo na administração pública. Um gentleman que se ofereceu para me levar até o carro, não sem antes me perguntar se eu estava "me relacionando com alguém", no intuito de indagar se "teria chance comigo".

"Nossa, existe esse ser?" - pensei... e quanto mais pensava, mais abria meu coração impoluto para aquela alma tão serena à minha frente. Nunca imaginaria que, um dia, pudesse querer tanto o meu mal, o bastante para machucar...ou tentar, pois, se aqui estou é porque me levanto firme e forte...

Tudo estava entrando bem calmamente em meu coração, despertando afinidade, pois, afinal, estava diante de um "par", um "igual". Nunca imaginaria que ali, naquele corpo aparentemente impoluto, habitava meu mais ferrenho algoz, uma alma cujo propósito de vida seria, dali adiante, atentar contra a minha vida e me submeter enquanto pessoa.

Aprendi, por fim, que bandido não tem estereótipo...esconde-se por trás da máscara de uma pessoa cordata, educada, atenciosa. Um ser que ofereceu um lugar em sua mesa para eu me sentar: só não sabia eu que a fartura de alimento, ali, naquela mesa, seria eu...Descobriria um tempo depois, já bem tarde, com suas mãos que, à escusa de me acarinhar, estavam, na verdade, em desespero, tentando salvar sua pele...Que egoísmo...

Pouco a pouco, enebriada pelo "achado" em meio a uma multidão que diuturnamente circula no restaurante, pensei estar diante da diferença. O bastante para o lançamento sem a menor pretensão de cautela, rumo a um desconhecido despenhadeiro. Entorpecida pela paixão avassaladora, não notei os sinais básicos...e, pouco a pouco, mais e mais, fui penetrando numa odisseia sem fim de construções lúdicas, perdendo-me de mim para viver a história desse Dom Quixote pós-moderno.

Não reparei - ou fingi que não percebi - quando ele, ao entrar em meu sacro lar, olhava para tudo, perguntando-me se eu "tinha estabilidade profissional". Será que se tratava de um golpe do báu? Afinal, morando num pardieiro - local que me apresentou como sendo um lar - pensei que se tratava de uma "pegadinha" perguntar aquilo justo para mim, já que minha casa sempre foi um local que fiz questão de deixar limpa...

Mas, enfim...

Também não percebi o sinal quando ele, bem calmamente, perguntou-me se poderíamos viver "um relacionamento aberto", pois julguei se tratar de uma proposta que ainda seria avaliada, e não um padrão de comportamento que ele já praticava... Ah, paixão! Faz tanto em nos cegar que sequer percebemos o óbvio, porque sempre acreditamos que alguém pode mudar, pelo simples fato de se relacionar conosco...

(...)

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