sábado, 8 de janeiro de 2011

O silêncio e a desventura da alma na senda dos deuses e ancestrais

Os dias de profundo silêncio podem ser uma oportunidade ímpar para desvendamento das inconstâncias que povoam nossa alma, pois o calar dignificado em diálogo com nossa essência, muitas vezes, revela os propósitos mais profundos e cujo enfrentamento nem sempre estamos dispostos e dispostas a fazer.

No ruído dos carros, da televisão, do som elevado, na artificialidade, enfim, de um mundo programado para não permitir o silêncio, ouvir a si é qualidade rara. O atropelo que a agitação provoca traz a sedução de busca na alteridade para as respostas que se sedimentam, pouco a pouco, como crostas impenetráveis, em nosso espírito, amalgamando um profundo abismo de ignorância que, se não for observado, acumula-se e se transmite para nossa herança, distanciando-nos de nossa parcela de divindade.

Reverenciamos nossos ancestrais, invocando-os em rodas de lua. Seguimos ritos e liturgias sagradas que, se não estiverem embaladas pelo silêncio, nada mais serão a não ser um formalismo que se distancia da vida em celebração.

Quantas vezes me peguei entoando cânticos de devoção à Lua sem, contudo, transpor-me para a benignidade dadivosa da Grande Deusa!

Ou, ainda, quase beirando a imiscuição na senda alheia, achando, confiando mesmo, que estava realizando um bruxedo inofensivo, quando, de fato, dentro de mim reverberava a mais profunda motivação em manipular o outro energeticamente. Isso é importante, porque mostra, no céu e na terra, em cima e embaixo, o quão propensos e propensas estamos em relação ao controle e à manipulação do outro, em descompasso com a ideia e o exercício de liberdade que somente é possível quando nos voltamos para nossa liberdade interna em não desejar agrilhoar quem amamos.

É muito importante estar atento e atenta para os meandros que nossa mente "adestrada" nos traz no caminho do Sagrado, pois, sem perceber, podemos entrar em uma espiral da mais pura ignorância em relação ao outro, ou, melhor, na ignorância de nós mesmos e mesmas, incidindo em tantos caminhos que machucam quem está à nossa frente.

Por isso o silêncio é importante.

Para o mais despojado exercício de observação do que conseguimos, por medo ou soberba, imantar em desfavor de nossa alma e dos outros, geralmente dos que mais amamos e dos que nos cercam, por questões bem claras de conexões e vínculos de outras egrégoras e existências.

É no silêncio que nossos ancestrais se comunicam conosco, alimentando o espírito de esperança diante das dificuldades que se colocam em nossos caminhos. É no silêncio que o ego chora, debate-se, vitimiza-se, chora, procura aliados nos abscônditos nichos dos inferii...

Mas, surpreendentemente, é nesse mesmo silêncio em que o ego chafurda que a libertação da alma encontra espaço para explodir na superação da ignorância... É nesse silêncio, enfim, que a vida brota, impermanente, fazendo vir à tona o que trazemos de mais sublime dentro de nós, a capacidade devocional de amar incondicionalmente, de nos entregarmos sem o "mas" porque, sem "mas" e sem o manto de sofrimento judaico-cristão de um sacrifício que demanda dor, o ammor, enfim, nasce. Só é possível o amor assim. O resto é ilusão de nossa mente programada para ferir e, com dor, achar que existe incólume...

Nesses dias conturbados em que me encontro em suspensão de mim, lembro-me de minha família, da força existente nas maravilhosas mulheres de la Vega que, como rochas, recebem tanto impacto da vida e, firmes e fortes, mantém-se na dignidade de si... Lembro-me das grandes e imponentes matriarcas que, com firmeza no propósito de viverem suas vidas na honra e na dignidade, travaram suas pessoais batalhas e sedimentaram o solo em que hoje piso.

Conversar com elas no silêncio de minhas meditações é alcançar os estados mais profundos de segurança e calmaria, sentindo-me amada e confortável o bastante para sustentar minhas próprias demandas, principalmente as que assolam meu coração. Não tenho medo ou vergonha disso, pois sou uma guerreira. E guerreiros sempre seguem o caminho da honra, independentemente o quão dolorida que seja a verdade a embalar a honra.

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