quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Sagradas Rainhas da Ilha...

Em genial cena do filme Elisabeth - A era de Ouro - quando a Rainha Mary Stuart recebe do emissário da Rainha Elisabeth a notícia de que seria executada no dia seguinte, no auge de sua majestade fala a todos li: "Vós não sabeis quem sois. Eu sei quem Sou. Sou uma Rainha e morrerei assim como vivi, como uma Rainha".

No dia de sua execução, Mary veste uma linda túnica vermelha, que deixa os ombros alvos à mostra e segue pelo corredor até a madeira onde deitará o pescoço. Não anda, flutua altivamente, lembrando que até mesmo os seres etéreos deixam passos de pedra no chão. Olha fixamente para o horizonte que irá receber sua cabeça. Seu olhar sequer se desvia para as damas-de-companhia, pois, Rainha, sabe de si.

E sabendo de si não esboça medo, pavor ou qualquer outro sentimento, mesmo que, dali adiante, enfrente a morte.

Afinal, era Rainha e morreu nos braços da certeza de ser imaculada e inatingível, ungida pela origem divina de sua estirpe, sabendo-se herdeira de um panteão de deidades e na certeza de que sua casa no Outro Mundo é povoada pelos ancestrais que se distinguem dos homens do povo.

A firme, forte, poderosa e plena Mary transpôs o mundo com a cor do sangue e do poder, o talismã dos cardeais, o vermelho que acena para a centelha do elemento fogo, retornando, assim, para a morada dos nobres no mundo dos espíritos...

A passada forte marca a resolução da diretriz de sua vida e, ao final dela - sendo ciente de si, a determinação em face de suas condutas, seus comportamentos, suas resoluções.
Mary tentou ascender ao trono em detrimento de sua prima, Elisabeth, que julgava bastarda. A ruiva era uma Rainha "puro sangue", na exata acepção da palavra e, sabendo de sua origem, desencadeou uma teia de ações e reações que culminaram em sua morte. Ela bem poderia ter vivido à sombra de sua prima, sendo vassala em relação à Rainha Virgem.

Se tivesse feito isso, talvez, a História ou nós, não teríamos substrato para falar tanto assim nela. Assim como Boudicca no filme "A Rainha da Era do Bronze", eis o recado que paira no ar: "grandes guerreiras e heroínas nunca morrerem porque o transcurso das eras demove da história a sombra do esquecimento."

Lembramo-nos de Elisabeth, é bem verdade, mas também nos lembramos de uma Rainha que poderia estar viva, mesmo estando morta em relação aos seus sentimentos, à sua vida e, sobretudo, à sua essência de sabedora de si.

Quando foi informada sobre a ciência de Elisabeth em face das cartas que secretamente trocava com Felipe da Espanha, Mary Stuart chorou... Urrou como uma grande ursa atingida no útero (tanto que no filme, segurou seu ventre, mostrando a pontada lacerante de dor em face do futuro inevitável que, a partir dali, estava sendo traçado).
Mas, mesmo urrando - por segundos - voltou a si, na plenitude de sua fleuma como imponente membro de uma casa real, segura de que seus propósitos foram cumpridos com lealdade. Afinal, era ela A rainha que deveria estar no trono da Inglaterra... Quem poderia, pois, julgá-la? Sua prima dita "bastarda"?

Qual o recado que Mary Stuart nos deixa? Ou, ao menos, o recado que ela deixa para o dia de hoje?

Mary se reconhece no Sagrado como deusa, perguntando para o vassalo se ele sabe, ao menos, quem é. Essa é uma pergunta muito capciosa, "quem sou?", nem tanto pela reflexão sobre nossa essência, mas, em refletindo (ou não, quedando ignorantes), sabermos nos apresentar e posicionar perante a vida sem o véu de encobrimento da verdade sagrada que nos move.

Quando nos dispomos a saber quem somos e, dentro disso, quando mergulhamos no profundo lago do autoconhecimento, somos brindadas pela possibilidade de compreensão da vida e, por resultado, do nosso semelhante. Posicionamo-nos no lugar dele, apreendendo como seria a reação se, por exemplo, adotássemos uma conduta, ou outra.

Quando sabemos ou procuramos saber quem somos adotamos uma postura - assim como Mary Stuart - de serenidade diante da vida, por ser a vida, em si, um mar onde nosso ego mergulha para, ao final da jornada, vir a se encontrar com o Todo, a Deusa, o Pai.

Sabemos quem somos, sabemos com quem nos relacionamos, sabemos, apenas sabemos.

Sabemos quais as posturas de dignidade, lealdade, amor e compaixão que devemos adotar, não por obrigação judaico-cristã de temeridade a um Inferno que, muitas vezes, para alguns, já é aqui, mas em face de nossa essência gratuitamente apontar para o bem-fazer moral, sob a égide da incondicionalidade no fazer o bem ao próximo.

Sabemos ou procuramos saber o que fazemos ao outro, ocupam-nos com o bem-querer alheio até mesmo acima do nosso - afinal, sabedoras de nós, agora, despojadas do ego, nossos capazes de amar o próximo como a nós mesmas - posicionando-nos acima do bem e do mal, em face das intempéries da vida.

Quando sabemos quem somos não precisamos nos esconder porque podemos olhar de frente, sempre de frente, para quem quer que seja e dizer a que viemos. Sem traumas, sem ranhuras. fazemos rupturas sem olhar para trás, afinal, sabemos quem somos e sabemos que trilhamos o mar ora calmo, ora turbulento.

Quando sabemos quem somos um manto de benevolência adere ao nosso espírito e a palavra passa a ser ouro. Sabemos o que falar, o que prometer. Não falamos demais e não prometemos o que nunca poderemos cumprir, quer seja uma reflexão, um encontro, uma parceria, uma amizade ou até mesmo um amor.

Quando sabemos quem somos poupamos o outro de enfrentar as idiossincrasias em nosso nome: assumimo-nos diante dos compromissos da vida. Crescemos, afinal, recém-saídas de uma "maratona Peter Pan" e encaramos o devenir com a serenidade daquele que caminha para a eternidade.

Quando sabemos quem somos dirigimo-nos, tal qual Mary Stuart, para o enfrentamento do desconhecido com a certeza de sermos embaladas pela fé.
É o que basta para sermos admiradas, eternizadas e, com isso, vivermos nos corações dos jovens nas histórias de jornadas heróicas que nossas herdeiras irão contar para suas linhagens.

Hey, ho!

3 comentários:

  1. Mo chara, Audrey!

    O Blog está cada dia melhor... Uma visão ampla e muito prática, mas com aquela pitada de bom gosto e muita magia!

    Beijos e muitas bênçãos!

    Rowena.

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  2. Hey, ho, querida irmã de vidas!

    Muita grata!

    Você tem parte nisso tudo...Sempre acreditou em mim e no que temos a partilhar!

    Dedico a você!

    Bençãos!

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  3. Lindo, Pleno, serene... Verdadeiro !!!!
    Felicitações!!!

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