sexta-feira, 30 de julho de 2010

O fim de um ciclo...

Quando sabemos que é o momento da "virada" de um grande ciclo?

Quando é o fim? O início? O meio? Uma hora achamos que está tudo acabado, em outras tantas tudo é bem claro a começar.

Mas, diante da montanha-russa do viver, não estamos prontos para perceber a mudança drástica dos ciclos, talvez, quem sabe, porque a apartação com a Natureza e seus ritmos ocupou o espaço do que, outrora, era comunhão.

O fim de um ciclo marca superações, bem como o retorno ao giro da roda de uma vida que vem e vai, espiralando no tempo e no espaço para que possamos cumprir nossa bela saga de existir multiplamente "para sempre".

Para alguns, momento de transposição de carmas para a elevação espiritual. Para outros, sentido de equalização dos haveres e deveres computados durante as outras existências.

Quem se lembra de Frodo, que iniciou sua jornada de maneira pueril, ingênua, finalizando seu ciclo de tal sorte que voltar para o Condado não seria mais opção?

Frodo não foi mais o mesmo depois que carregou o fardo do anel. Superou-se e, na superação de si, foi levado e elevado pelas grandes águias que surgiram do horizonte, retirando-o do mar de fogo (fogo da espiritualidade) para os céus.

Na metáfora perfeita mais que perfeita, Frodo, ao enfrentar a si no alter-ego Gollum, transpôs o mar de adversidades de sua existência, renascendo do fogo de Mordor para a redenção. Ele estava deitado na pedra, que representa o abrigo da Terra, Gaia, Grande Mãe, esperando seu renascimento, o cumprimento de sua sina no ciclo de retorno.

Daí, em uma morte simbólica - pois não achava mais que fosse sobreviver ao calor de Mordor - foi retirado de lá pelas águias, que o lançaram no grande voo para uma nova forma de contemplar a vida.

A ferida não fechou. A cocatriz doía. Depois de 4 anos, Frodo ainda sentia a pontada do fio afiado da espada do Rei Negro.

Melancólico, vivia e sobrevivia no Condado, como se espiritualmente não mais ali estivesse. Transitava em meio a uma multidão, na companhia de seus amigos mas, a bem da verdade, havia transmutado sua essência o bastante para o Condado não mais ser o seu espaço sagrado.

Ao partir com os elfos, Frodo atravessou um mar, o mar que separa os mundos da carne e do espírito. Acompanhar os elfos tem seu significado: seres de muita luz, não poderiam mais permanecer na "Era dos Homens" sem que sua integridade espiritual fosse atingida.

Frodo, em sua saga, também se elevou, aproximando-se da dignificação da luz élfica e, com isso, não podendo mais permanecer em um mundo que não era mais o seu.

O olhar de Frodo ao se despedir dos amigos traz o semblante de depuração. Ele não chora em momento algum da despedida, porque sabe que aquilo ali tudo é efêmero.

Ruma para um alto plano espiritual, juntamente com Gandalf, arauto de uma nova era na Terra Média. Sam, seu fiel escudeiro, em sua senda pessoal, não pode acompanhá-lo, porque, diante da diferença de caminhos, cada um percorre sua saga. São os ciclos.

Um ciclo que lança no ar a melancolia e o saudosismo.

Qualquer que seja o sentido dado ao momento de fechamento de ciclos - que depende muito mais da construção de nosso conteúdo espiritual latente - a grande verdade é os fins marcam os ritmos da maneira helicoidal com a qual a Natureza - grande Mãe - equilibra a vida.

Como vivo os ciclos?

Viver intensamente é morrer a cada instante, extrair da existência o eterno fruto, seja ele doce, amargo, frio ou distante. É amar o anônimo por instantes e prolongar, a todo tempo, espaço e momento, para, depois ao contemplar sua própria vida, deixar o tempo escorrer ao sopro da brisa e do vento.

É compreender as chegadas, sorrindo nas partidas como se fossem eternas, vindas, idas e vindas - que se completam, lindas - de mãos dadas, porém, cingidas. Viver e amar é explodir como se fosse o último veio de ar, é sentir, como se nada mais se pudesse falar.

É sofrer cálida e silenciosamente como se o fim estivesse próximo, e o ser, ausente.

Viver intensamente é regressar, sair do etéreo pó e às cinzas retornar, compondo o eterno ritmo do vida-morte-vida. É olhar para trás e vislumbrar o futuro incerto, devenir inconstante. Sôfrego júbilo, num coração pulsante que bate indócil em sua partida.

É dizer adeus e se calar, atrás de cada um dos dias a se firmar o rastro do céu, translúcido infinito.

É aguardar, esperar e crer, motivar a vida no misterioso ser, essa insofismável fonte de sentir...

É o fim de um grande ciclo...

2 comentários:

  1. Oi, tudo bem?
    Gostei muito que vc tenha usado a jordnada de Frodo. Gosto muito desse livro e passei a gostar ainda mais quando li e assistir o Poder do Mito com Joseph Campbell, onde ele fala da Jornada do Herói. É muito legal.
    Acho que todos nós temos uma jornada a ser cumprida em nossas vidas, cada é Herói em sua própria existência. Issa dá até um pouco de medo, medo de não conseguir destruir o anel. Mas acho que assim que a Jornada começa o medo deve ser domado para que todas as experiências possam ser vividas completamente.
    Gostei muito desse post,
    Tenha um Feliz Imbolc.
    Bjus
    Morgana

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  2. Oi, Morgana!

    Engraçado esse post: havia acabado de acessar uma memória de vida passada em que me deparei com uma pessoa querida com quem tive uma grande, profunda, e dolorosa experiência. Engraçado que, ao tempo do post, o processo de finalização do ciclo, no presente, já estava se desenrolando e culminou num evento na sexta-feira à noite (o post foi lançado à tarde). Às vezes, muitas vezes, identifico-me com Frodo em suas experiências de dor que, ao final, trazem a redenção e a impossibilidade de voltar.
    Não existe retorno na linearidade, pois ainda não aprendemos, enquanto humanidade, a dar saltos quânticos de ruptura de espaço-tempo. Quando muito, conseguimos vivenciar memórias passadas, mas sem que, com isso, possamos entrar nas histórias e modificar substancialmente o que ficou para trás.
    Por outro lado vejo que podemos mudar o presente e, com isso viabilizar outras opções para o futuro.
    Gosto muito de Campbel, asism como de Levi-strauss... Mircea Eliade também...adoro mitos e jornadas heróicas...se aprecia, sugiro o site da grande amiga Rowena, o www.templodeavalon.com, onde posto, juntamente com articulistas excelentes, textos de mitologia celta.
    Grata pela participação enriquecedora!
    Audrey...

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