segunda-feira, 5 de abril de 2010

Faxineira? Secretária do lar? Saia dessa e pegue uma vassoura!


Já tem um tempo desde quando pensei na questão do trabalho doméstico...

"Secretária do lar", "colaboradora", "diarista", não importa, são truques semânticos dentro de uma percepção politicamente "correta" para tentar aliviar a carga diametralmente oposta, da humilhação, opressão e do descaso que o serviço doméstico ainda possui.

Palavrinhas bonitas forjadas na cotemporaneidade para designar práticas coloniais de subserviência não desnaturam a essência da percepção com que se vê o trabalhador doméstico, sob o estereótipo de uma pessoa sem educação, cultura, geralmente mulher e negra.

Fico abismada quando vejo alguém que se rotula (eu não faço questão de rótulo, mas, quando a pessoa se reconhece num local de fala de rotulação, não posso fugir disso) coerente em termos de sustentabilidade, de luta por igualdade social etc. manter uma trabalhadora doméstica e lhe pagar o parco salário mínimo.

Ou bem remunera dentro da ótica do relevo da atividade (acho complexo e um ato de adoação limpar a latrina de outra pessoa), de acordo com o valor do que está em jogo, ou, então, pegue a vassoura, meu, e vá varrer. Isso, pois até mesmo o exercício sacerdotal e diário de limpeza pode dar a exata medida do que é o trabalho dentro de casa.

Minhas mãos estão enrugadas, com marcas de produtos de limpeza, ou, ainda, com calos de tanto torcer roupa. Divido-me entre os livros do doutorado, críticas feministas e... pratos, fezes e urina de gatos e cão, almoço, pão etc. Hoje sei que qualquer trabalho em casa - no espaço privado - adquire um sentido de sensibilidade similar ao trabalho mental no espaço público. A lógica capitalista que distorce essa perspectiva e atribui sentidos e valorações assimétricas.

Não teria ninguém aqui em casa por menos de R$1.800,00, num chute mal dado, porque, de fato, estou equiparando ao valor da bolsa de doutorado. Como não tenho e, talvez, ainda assim, não concorde com a dimensão discriminatória dada ao trabalho doméstico, prefiro rachar as mãos a explorar pessoas...

4 comentários:

  1. Pondo lenha na fogueira... é raro ver alguém que não se aproprie do argumento capitalista para tentar amenizar sua própria culpa quanto à desigualdade social, ao "contratar" alguém para fazer em boa saúde o que todos poderíamos fazer dentro do reconhecimento do coletivo. É muito mais fácil "oferecer" um salário mínimo (?) para "ter tempo" de se anestesiar, como a maioria faz, usando como subterfúgio o descanso mental (coisa que não exite) na frente da televisão.

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  2. Concordo com você, Ju! Sempre achei que manter uma pessoa fazendo a faxina "para mim" seria uma forma de distribuição de renda, mas concluí que esse discurso é pseudo-altruísta, na medida em que não adentra o pano de fundo, que é exatamente a natureza do vínculo de subordinação, de manutenção de baixa auto-estima e de desvalorização. Não adianta, é uma profissão subestimada no ideário popular, desde a época colonial.
    Há quem diga que é um dos resquícios do colonialismo.

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  3. Fala sério, é uma profissão como qualquer outra, imagine se nas empresas não houvessem as pessoas que cuidam da limpeza..me desculpem mas é lindo escrever na prática não da mesmo cuidar de casa filhos, trabalhar fora. e etc...pago com muita honra os serviços domesticos.

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    1. Boa noite, grata pelo e-mail! Acho que não fui clara em minha exposição. A profissão de diarista é uma profissão - ou deveria ser - como todas as outras...Não afirmei o contrário, mas apenas comentei o contexto brasileiro, que reproduz uma ótica de "casa grande e senzala", por não prestigiar a profissão com a seriedade, por exemplo, que é feita em países que trazem valores de horas e diárias bem mais avantajados. Em alguns países europeus, a exemplo da França, as pessoas que fazem diária não raro são pessoas munidas até mesmo de curso superior, porque a profissão não é discriminada. Quando postei no blog insurgi-me em relação à falta de um respeitoso tratamento conferido às diaristas. Tanto isso é verdade que, se realmente a profissão fosse tomada pelo povo brasileiro "como outra qualquer", caro(a) amigo(a), não haveria uma regulamentação específica na CF, pois bastaria a regulamentação genérica que a Carta traz a TODOS os outros empregos...Fico feliz em saber que sua cabeça é diferente, mas, por certo, não me referi a sua pessoa, mas ao senso comum estabelecido no Brasil. Além disso, posso garantir que meu posicionamento é "na prática", pois trabalho 60 horas por semana, em três turnos. Tenho uma casa, com esposo, cachorros, gatos, advogo, faço doutorado, atuo na área criminal, com audiência todos os dias. Portanto, estamos no mesmo barco...Estar "na prática", contudo, não me limita a não refletir sobre minha conduta, pois seria medíocre e pouco evoluído...Crescemos na medida em que aliamos prática, discurso e reflexão, pois, caso contrário, nobre amigo(a), seríamos meros robôs reprodutores de idiotices...

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