quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Sobre o urro ancestral da faculdade injuriada

Na quinta-feira passada a professora Débora Diniz comentou, no espaço do Estado de São Paulo, a reação da "comunidade acadêmica" em relação a um vestido cor-de-rosa usado por uma estudante, que foi explicitamente assediada por uma trupe de estudantes "indignados" com o ataque aos costumes e aos bons valores...

Argh, quanta mediocridade se revela na reação...

Não consigo compreender como em pleno século XXI alguém ainda fala em moral e bons costumes, numa compreensão burguesa de castração feminina, bem como de controle de sexualidade.

Sim, a reação em cadeia apenas mostra o retrato de uma sociedade hipócrita, misógina, androcêntrica, machista e, sobretudo, mesquinha, que deita seu posicionamento de vida em cima de tão frágeis preocupações. Nossas preocupações com a moral são tão efêmeras e contraditórias que expomos nossos corpos no Carnaval, mantramos músicas de triplo sentido (triplo sentido, mas, de fato, querem apenas expressar o óbvio, sexualidade), sacudimos nossas tetas, bundas e pintos, em gingas de expressão de sexo. Nada contra, afinal, cotidiano popular. Segundo alguns - Casa Grande e Senzala - parte de um DNA. Nada contra, nada contra mesmo...

Agora, tudo contra o acossamento da menina, porque, afinal, parte dos algozes se requebra nas micarês da vida, parte assedia mulheres, pilhando-nos nas noites urbanas, com o afã predatório de nos colocar como presas...Enfim, não consigo entender tamanha hipocrisia...

Aliás, minto, entendo, porque, dentro do estudo de gênero, isso é apenas uma manfistação simples do que Foucault e um bando de outros autores e teóricos mencionam há tempos: aa ira em relação ao corpo feminino. Ainda somos objeto de controle, pois não bastam as mutilações que fazemos em nome de um ideal, agora tempos que brincar de boneca, ganhar jogo de panelinha, andar de cor-de-rosa, bater palminha e nos submeter ao que os outros determinam como padrão...

Nada, nada mesmo justifica o acontecido. E mais odiosa ainda é a valoração que nós, MULHERES, fazemos em relação às nossas pares: nós somos as maiores algozes de nossas irmãs, porque, num mundo que nos odeia (o mundo misógino odeia o feminino), insistimos em chamar a outra de "puta", "vadia", "periguete" (essa última palavra é engraçada), adjetivos que apenas têm significado porque as AUTORES SÃO MULHERES.

Afinal, o homem ser galinha, puto, perigueto (hehehe, será que é assim?) é atestado de virilidade, porque o pênis fala mais alto na historicidade atroz que nos empurrou, até agora - salve melhor juízo - para a latrina... Guerras, chacinas, extermínio, eugenia, tudo feito em nome da testosterona... desafio alguém a mostra, com dados históricos e com o carbono 14 algo diferente disso. E, ainda que encontrem, a exceção apenas confirmará a regra.

A faculdade - nem sei que faculdade é essa - como IES não deveria fomentar o desrespeito aos postulados báscicos de dignidade, previstos constitucionalmente. Os alunos e as alunas, então, lamento... Mas isso, no auge dos 15 anos de docência, não constitui conduta cidadã, adulta e razoável. É uma chacina moral, um retorno às galés inquisitoriais, um Estado de exceção. Incompatível com uma demanda por espaço de democracia...

Isso não revela uma comunidade acadêmica, mas sim uma horda sanguinária, que, à escusa de sacrificar seus bodes pessoais, suas frustrações com os fortes ids, apenas extravazam um superego perverso... Isso é perversidade... Nada mais.

Enquanto legitimamos a pauta de reificação dos corpos e da alma da mulher, alimentando cifras de IBOPE nas bundas, nos peitos e nos rostos plastificados, não existe legitimidade para a perseguição. Ainda que não fôssemos assim, NADA JUSTIFICA A AGRESSÃO MORAL...Nada...não em um Estado que se nomine democrático de direito...

O comportamento da "comunidade" revela a ancestralidade mais macabra: a de extermínio...

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